Brincar com sons
Juntar letras
Formar palavras
Descobrir a sonoridade e o nome de tudo
Que está no mundo
nas coisas
no pensamento.

Ler é tão bom!

Poder viajar
Conhecer mundos de ontem
de hoje
de amanhã.
Imaginar.
Criar.
Sonhar.
A leitura permite isso e muito mais
Pois ler é tão bom!

terça-feira, 13 de julho de 2010

FOLCLORE E LIVRO DIDÁTICO


A NAVE DA SABEDORIA / Antonio Rodrigues da Silva / Caruaru/PE
(XI FENEARTE, 02 a 11/07/2010, em Olinda/PE)


FOLCLORE E LIVRO DIDÁTICO
Thelma Regina Siqueira Linhares

Nos últimos dez anos, tenho analisado mais criteriosamente os livros didáticos destinados às primeiras séries do, então, 1º grau, hoje de acordo com a LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – as quatro séries iniciais do Ensino Fundamental.
E, desde então, uma pergunta vem amadurecendo: por que os autores dos livros didáticos não usam, com mais frequência, cumplicidade até, o folclore em suas obras? O fato folclórico, vivenciado no cotidiano escolar, traz, para a sala-de-aula, o lúdico, o prazeroso. Resgata experiências. Socializa conhecimentos. Estreita relações pessoais e de grupos.
As escolas públicas e particulares trabalham intensamente, no mês de agosto, as diferentes manifestações folclóricas, aproveitando a deixa da data universal do folclore – 22. E, apesar de ser um mês longo – 21/22 dias úteis – transcorre gostosamente motivado pela riqueza, variedade e beleza de temas folclóricos. Ditados populares são analisados. Lendas e mitos são personificados. Brincadeiras e cantigas de roda são revividas nos recreios. Concursos de brincadeiras e brinquedos populares são realizados. Aulas de medicina popular com exposição de ervas e até o fabrico de chás e lambedores acontecem nas escolas. Receitas de pratos e bebidas típicas são trocadas. Danças e folguedos são vivenciados. Enfim, é um mês com alguma coisa diferente no ar, um diferencial significativo que o torna ímpar em relação aos demais meses do ano letivo, quase sempre tão cheios de mesmice...

O mês de junho, aqui no Nordeste, é outro período de se vivenciar intensamente o folclore nas escolas – no chamado ciclo junino – pois é grande a popularidade dos santos: Antônio (13), João (24) e Pedro (29) – patronos do mês. Uma rica e variada culinária, ritmos, danças e rituais dão sabor e características singulares à época.

Das dezenas de livros didáticos observados, muitos fazem uso de algum fato folclórico como tema para leituras, estudos linguísticos, ortográficos e gramaticais nos compêndios de Língua Portuguesa, ou, então, compõem os textos informativos dos livros de Estudos Sociais, que, por força da LDB, passaram a ter os conteúdos científicos separados em volumes de História e Geografia. (Os autores e as editoras estão, ainda se organizando para tal, na grande maioria.)
De modo geral, os livros didáticos trazem informações superficiais do folclore, inclusas no calendário das datas comemorativas. Quase sempre carecem de dados mais detalhados, em especial, nos de 3ª e 4ª séries, que poderiam trazer conteúdos mais minuciosos e abrangendo mais fatos e manifestações folclóricas.
Nos livros didáticos de 3ª série, cujo conteúdo se refere ao Estado, com raríssimas exceções, a falha de referencial específico do folclore estadual ou regional é muito observada. Necessitam de dados e dicas relevantes para estudos, tais como: principais fatos e manifestações folclóricas do Estado; pessoas que encarnam o folclore (artesãos, poetas populares, etc.) centros, locais e entidades de vivência do folclore e principais estudiosos, pesquisadores de ontem e de hoje.
É imprescindível, também, a compreensão que o fato folclórico é relativo a determinado grupo social, inserido no tempo e espaço próprios.

Quais as manifestações folclóricas mais freqüentes nos livros didáticos das quatro séries iniciais do Ensino Fundamental?
As lendas e mitos, particularmente de origem indígena, são mais frequentes nos livros didáticos. A lenda da mandioca, da vitória-régia, do milho, da Iara são as mais descritas. Entre os mitos, destacam-se: Curupira, Caipora, Saci-Pererê, Iara, Boitatá e Mula-sem-cabeça.
As fábulas de domínio universal - Esopo e La Fontaine - são referenciadas tendo Monteiro Lobato como escritor/tradutor. Inegavelmente, o marco referencial da literatura infantil no Brasil, quer se considerando o editor, o tradutor e, em especial, o escritor – o primeiro autor brasileiro a escrever para o público mirim, aproveitando mitos e personagens
tipicamente nacionais.
As tradicionais histórias da carochinha, dos clássicos Anderson e Irmãos Grinn, chegam a receber versões e adaptações de autores contemporâneos.
Provérbios, ditados populares e frases feitas são conteúdos trabalhados com certa regularidade.
Adivinhações, trava-línguas e parlendas são mais frequentes nos livros didáticos de 1ª e 2ª séries.
As cantigas de roda aparecem com frequência e em quantidade nos livros didáticos, em especial, nos de 1ª e 2ª séries. Falta a partitura no acompanhamento das letras, mas, como a maioria é de conhecimento no Brasil, como um todo, a ausência da linguagem musical não é um dado tão relevante, mesmo porque, esse conhecimento é específico, e, nas escolas públicas ou particulares, profissionais dessa áreas se constituem raridade.
Receitas de culinária de pratos típicos costumam fazer parte do livro didático como ilustrativas de exemplo de texto específico – receita. Em geral, associadas ao ciclo junino.
As danças e folguedos populares são relatados nos livros de Estudos Sociais, cujos textos, geralmente, são acompanhados de fotos e se referem aos ciclos carnavalesco e natalino.

Como viabilizar uma maior representatividade do folclore no livro didático?
Dentre outros pontos sugerimos:
Observar que o folclore permite uma aplicação concreta dos PCN-Parâmetros Curriculares Nacionais ao ser inserido nos conteúdos da “pluralidade cultural”, um dos componentes dos temas transversais da atual política educacional no país.
Conhecer para valorizar, sem preconceitos ou discriminações. Reconhecer que diferentes culturas, manifestações culturais e saberes são tão importantes quanto àqueles socialmente constituídos e aceitos como padrão pelas classes dominantes. Saber e cultura erudita x saber e cultura popular, sem identificar nessa relação, oposição ou antagonismo e, sim, faces de uma mesma moeda: a identidade cultural brasileira, a expressão da identificação de brasilidade – do povo e do país.
Repensar práticas pedagógicas, rever conceitos e preconceitos, talvez, permitam aos autores incluir, mais frequente e conscientemente, o folclore nas suas obras didáticas, materializando, assim, a salutar parceria entre folclore e livro didático.


Bibliografia
CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 3ª Ed. Brasília:
Ministério da Educação e Cultura. Instituto Nacional do Livro. 1972.
LDB-Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei Federal 9394; de 20/12/1996.
PCN-Parâmetros Curriculares Nacionais: pluralidade cultural, orientação sexual. Vol 10,
Brasília: MEC/SEF, 1997.


Micromonografia da série Folclore - nº 265 - set/1999. FUNDAJ.

www.usinadeletras.com.br em 23/03/2002